terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Juan Luis Segundo, o teologo dos pobres e do reino

O HOMEM DE HOJE DIANTE DE JESUS DE NAZARÉ II/I
Sinóticos e Paulo história e atualidades

CAP 3 – A proximidade do Reino

Pretendendo apagar de antemão um mal entendido hermenêutico entre ou “político ou religioso”, ao analisar as ideologias do Jesus histórico enquanto a sua trajetória percorrida na terra, Juan Luis Segundo, aborda neste capitulo questionamentos interessantes: “Como foi que um homem comum, sem autoridade religiosa alguma começou a interessar a seus contemporâneos”? E isso sem pregar a si mesmo e “como passou através da poderosa e complexa estrutura religiosa?”. Jesus com o seu discurso, afeta concretamente a vida do homem, fazendo com que houvesse um fim político e não aparentemente a fundação de uma religião. As palavras de Jesus de Nazaré tinham profundas sugestões políticas e não duvidosas, sendo que ele anunciou mensagem religiosa em forma de chave política e dessa forma manifestou a Deus. Quanto mais políticas de mudanças se revelava, toda afinidade com acondicionamento morais, espirituais ou religiosas fossem desprendidas dos grupos humanos tornavam-nos mais religiosos. É com estas duas hipóteses que o autor trabalha ao interpretar a mensagem global de Jesus de Nazaré.

Juan Luis Segundo questiona então sobre o que consiste este “Reino de Deus”, por que e para quem estabelecer uma boa notícia e por que esse “evangelho” (boas novas) exigia mudar de mentalidade? Utiliza então os textos sinóticos a Paulo apresentando uma interpretação sobre “bem-aventuranças”, tomando como base uma exegese da obra clássica de J. Dupont. Primeiro provavelmente o texto mais coerente vem narrado na 3ª pessoa “felizes os que...”, (como em Mateus) provavelmente a quarta bem-aventurança de Q (razão das versões divergentes de Mateus e Lucas), onde contêm uma predição de perseguição futura, sendo que isso não implicava aos discípulos sobre as dificuldades que haveriam de acontecer, mas Jesus declara a situação das bem-aventuranças para transformar em virtudes e a definir o que consiste esse “Reino de Deus” que chega com a articulação que para os pobres, Ele veio para mudar esta situação e por um fim, já que não há humanização nenhuma na pobreza e sim uma relação intrínseca e positiva entre reino e situação do pobre.

Juan Luis também apresenta controvérsias nos textos sinóticos, por um lado sabendo que os textos de Lucas foram escritos para os leitores helenistas diferenciados dos outros sinóticos, por assim saber que na igreja primitiva de Lucas, no livro de Atos, a partilha dos bens que nela se praticava não poderia haver necessitados, versão que contrapõe da existência humana: pobreza e riqueza e por outro, sendo ainda que a fonte Q, apesar de ser mais próxima de Jesus do que o atual evangelho, não é garantia de que Jesus tenha pronunciado as bem-aventuranças, além do termo “pobre” ser mais pronunciado pelos cristãos do que por Jesus. Então a quem cabe o direito a este Reino, Já que até os próprios discípulos continuavam explorarados pelas ideologias religiosas e por fazer eles partes deste grupo de “pobres”? Vale ressaltar que neste tempo o “Povo da Terra” (os judeus) tinham uma sociedade hierárquica não segundo a sua fortuna ou poder político, mas segundo critérios religiosos.

Como Jesus não podia pronunciar-se a todos ao mesmo tempo, escolhe então anunciar o Reino a quem perdeu tudo, são eles os publicanos, prostitutas, doentes e aleijados, os chamados “pobres” da época, os amaldiçoados e desprezados, ou seja, os pecadores, não que haja uma unificação de pobre e pecadores, mas, os pobres são pecadores, por ser marginalizados na sociedade de Israel, a estes Ele vem trazendo para uma realidade os projetos de Deus através da Sua revelação, com isso acontece uma mudança político-social-religiosa simultaneamente com a estratégia política do Reino correspondendo a uma nova notícia de Deus no caráter religioso contra a exploração do seu povo.








CAP 4 – As Exigência do Reino
I – Conversão e Hermenêutica

Com a imanência do “Reino de Deus”, se estabelece 03 (três) grupos: os “pobres”, ou seja, os destinatários a receber as boas-novas (os convidados naturais); os que ficam na sua companhia para enviar e pregar as boas novas (os discípulos), com isso à estratégia libertadora, política e conflitiva de Jesus cria-se um terceiro grupo, os que não se levam à compaixão, os opositores, aqueles aprisionados ao mecanismo ativo da opressão e que devem receber o reino com “ai” (os ricos, os justos e representantes religiosos). Para encontrar o significado da mudança de mentalidade ou “conversão”, que de acordo com Juan Luis segundo está representada nas polêmicas (parábolas) de Jesus (Joachim Jeremias reconhece 38), existe a necessidade lógica para compreensão das exigências em possuir este reino. A interpretação é que a boa noticia da chegada do reino não é o evangelho para todos e sim para o grupo dos pobres e mostra ao mesmo tempo, com todas as dúvidas que isso traz consigo a preferência que tem por eles, por um lado, e as profundas correções que deseja introduzir, por outro, na maneira que eles têm de idealizar a Deus e a religião.

Na definição de Juan Luis, Jesus utiliza-se de parábolas para legitimar seus ataques e a defesa dos que se opõe ao reino. O primeiro grupo de parábolas inicia-se com prevenção da chegada repentina do definitivo e destrói caluniosas garantias designada por uma elite social, econômica e política que exerce forte controle sobre o conjunto da sociedade, com isso sentem-se protegidos e confiantes de que este reino não os abalará, porém Jesus os desilude, de acordo com a interpretação sócio-econômica dos textos sinóticos de Lucas como as parábolas do rico insensato e do administrador infiel e outra conflitiva político-religiosa do ladrão noturno em Mateus. O segundo grupo coloca as bem-aventuranças entre uma oposição com o primeiro, ou seja, por se acreditar garantido pelo reino e coeso pelos que se tinham excluídos da pobreza, os marginalizados de Israel (pecadores), Jesus não os idealiza se são bons ou maus, mas suas parábolas os generalizam. As citações de várias parábolas para como: a do banquete, onde “todos” são convidados a sentar-se na mesa; a do filho pródigo, na qual o pai estava a aguardar a volta do filho que estava perdido e a da ovelha, que o pastor vai ao seu encontro, escrito nos sinóticos, desperta uma intensão de conflitos entre esses grupos e estabelece que para quem o reino e faz presente, para os que sofrem e estão perdidos. Juan Luis Segundo tem como base nos textos de Lc 15:7 e Mat 18:13 “a alegria no céu será maior por um pecador que se converta do que por noventa e nove justos que não necessitam de conversão”, ou seja, o estado perdido é a causa suficiente para a alegria paterna. Jesus é radical, mas restringi-se a mostrar dois grupos opostos e não detecta ainda o mecanismo como um grupo oprime o outro.

O terceiro grupo de parábolas é qualificado por inverso do juízo de valores dos dois campos que divide Israel: justos e pecadores e é ilustrada aqui através das parábolas de Mateus (21:28-32) sobre os dois filhos, onde o primeiro representa os pecadores, que mesmo rejeitando a ordem do pai as cumpre o e segundo filho representando os justos que mesmo dando vontade de obedecer descumpre a ordem paterna. O que se vê é um paradoxo de quem na verdade é justo ou pecador. Outra polêmica está no anúncio de Lucas 4:19 numa simetria do “ano da graça do senhor” com as “bem-aventuranças” onde relata a divisão por igual dos bens e da liberdade a cada cinqüenta anos entre todos os israelitas, recobrindo assim suas possibilidades humanas, porém a isso legitima a opressão penetrando inclusive nas mentes dos oprimidos, isso faz com que o resultado da divisão do trabalho seja atribuída a opressores e oprimidos como virtude de Deus, mas o Deus de Jesus não sente assim as coisas. Com efeito, aparece o critério com que Deus julga o que é pecado: não o contrario à lei, mas o contrario ao homem (pág. 197). É a preocupação e compaixão pelo homem, e em especial pelo que sofre que Jesus estabelece a justiça, a misericórdia e a fidelidade.

Para isso Jesus indica um aparato para destruição ideológica do opressor representado no quarto grupo de parábolas que versa sobre a chave hermenêutica, onde consiste para Jesus entender o homem e pôr a sua plena humanização para que agora o homem possa compreender que a conversão (necessidade da mudança de mentalidade) fundamental para aqueles que receberam as boas notícias não passa de privilégio e sim responsabilidade, “deixa de se crer fim para se sentir meio”. Juan Luis segundo descreve que para combater uma interpretação radicalmente errônea é preciso se endereça as três primeiras parábolas, a dos talentos, em Q (Mt 25:14-30; Lc 19:12-27), a do sal (Mc 9:50; Mt 5:13; Lc 14:34-35) e a figueira de Lucas (Lc 13:6-9). As três têm um elemento comum: a importância não está nunca nas coisas em si, no que pode ser objeto de posse, e sim numa funcionalidade, num fruto que dela se espera e para isso a parábola de Jesus no contexto de Lucas sobre o samaritano, o levita e o sacerdote referente àquele que caiu em poder dos ladrões é muito bem apresentada como o mais importante do que aquele que a quem se deve amar é aquele em que ama de verdade. A proximidade (sentido da frase do original “amar o próximo”) não é conseqüência da lei e sim premissa, consiste em uma inclusão mútua entre pessoas ou grupos. Jesus então estabelece uma radical mudança de mentalidade no sistemático ideológico religioso opressor introduzindo não só que as tradições legalistas substituíram os fidedignos mandamentos de Deus, mas que até estes não estabelecem a vontade de Deus geradora de valores morais. Deus não alcança ao homem com receitas morais pré-estabelecidas, ou seja, só quem tem intenções baseados no amor entende corretamente o sentido benéfico dos mandamentos a fim de converter suas vítimas em sujeitos conscientes e ativos na luta.


CAP 5 – As Exigência do Reino
II – Profetismo e Conscientização

A multiplicidade e a maneira indefinida do que se esconde sob o título da construção do “Reino de Deus”, faz com que exista uma contradição entre duas leis. Os pobres e pecadores são convidados por Jesus a fazerem parte do seu discipulado, já que o reino lhes pertence, em contra partida, oferece-lhe um julgo mais leve, ou seja, estarão sob a lei de Jesus que analogicamente confronta com “o que diz na lei” dos escribas e fariseus, fazendo uma exigência muito mais pesada: “eu, porém vos digo”, por este motivo os três sinóticos oferecerem depoimentos evidentes de um conflito político-religioso que opõe Jesus e os pecadores das autoridades judaicas.

Fazendo uma exegese dos textos de Marcos, Juan Luis abre hipóteses de trabalho ao se referir aos grupos já citados anteriormente. Primeiramente discursa sobre os chamados oprimidos e pecadores (povo) e deles nada é exigido diferente do grupo dos opressores. Conseguinte o outro grupo dos oprimidos e pecadores, agora colaboradores (os discípulos), Ele exigirá o que a missão sugere qualidades proféticas com toda prudência e compreensão. Porém o medo de Jesus é que seus discípulos não entendam as idéias de oposição Dele ou entendam apenas como religiosas, por este motivo Jesus oferece aos discípulos a parábola do semeador e do fermento (dado somente aos discípulos), encontrados nos sinóticos em chave política, já que esse era o meio utilizado por Jesus para o grupo de opositores do reino para que não se convertessem e fossem perdoados, sendo que os discípulos não necessitavam de conversão e sim abrir aos olhos para compreender o segredo do reino. Neste ponto é indispensável ressaltar que Jesus não estava dando aula de religião e sim desmascarando um conflito que se aparentava ser religioso pelos seus opositores, que visavam dominar e explorar outros homens, citado por Juan Luis Segundo da obra de Joachim Jeremias (Lês Paraboles”, pág. 16).

Jesus prepara a chegada do reino utilizando dois elementos na atividade em respeito aos pobres: com prodígio e métodos em instruir e praticar com clareza sua missão. Usou de poderes de modo muito especial para com os pobres e necessitados para anunciar de modo fidedigno a presença do reino de Deus, mas não sua vinda propriamente dita do reino e sim seu anúncio em forma de sinais, sinais estes que tem uma coerência entre valores do reino que chega e os valores que visivelmente procuram os interlocutores, prováveis adversários de Jesus com os milagres que eles solicitam, para que assim apareça na qualidade significativa o elemento decisivo na relação existente entre Jesus dos milagres e os pobres que é o segredo messiânico, ou seja, está mais relacionado com o trabalho de conscientização através dos milagres do que uma dúvida na consciência que Jesus tem de si mesma. Os sinais do reino são benefícios reais, incontestáveis enquanto tais para o que recebem. O segundo elemento é apresentado de forma a instruir as suas parábolas e Jesus mediante ao método messiânico pretende manter distância para poder ensinar e mostrar que ele é o sinal de alegria para as multidões de Israel








CAP 6 – A VINDA DO REINO

Neste capítulo Juan Luis Segundo determina com certa prudência dados mais fidedignos de que se dispõem os sinóticos e questiona, será que Jesus não se enganou ao anunciar que o reino de Deus já se tinha iniciado em sua geração? Ou pelo menos é essa a impressão, pois as desgraças continuaram com os “felizes os que...”, enquanto existiam mais famintos e os ricos continuaram a triunfar e multiplicar mais esfomeados até hoje, a menos que se trate de uma prosperidade e fartura ultramundanas. Juan Luis descreve que no livro de Mateus há citações de Jesus usando três expressões diferentes para reino, são eles: “o reino”, “o reino de Deus” ou “o reino dos céus”. O certo é que ao estar nesta época de busca pelo Jesus histórico deve-se fazer em excesso de perspectiva, pois nem mesmo a Igreja Primitiva não pode ao que parece fazê-lo de maneira distinta, embora com mesmo sentido.

E tomando esse rumo principia-se pela aparição de dois personagens, João Batista e Jesus, todavia o primeiro evangelho apresenta discordância entre ambos os profetas no sentido ideológicos do que significa concretamente essa proximidade. É o que se vê no contexto de Mateus e Lucas referente ao estilo de vida, onde um não bebe e não come, enquanto o outro, é beberrão e comilão; João prega a iminente manifestação visível da ira de Deus e é quem melhor representa a as idéias apocalípticas da época, combinando “reino de Deus”, juízo e catástrofe cósmica. O Jesus aparenta sintomas de individualidade na sua pregação de acordo com Mateus 5:2, assim sendo é que a proclamação de Jesus caracteriza-se como de uma alegria, a boa-notícia, relacionando o dia de Javé com a vinda do seu reino. Juan Luis Segundo dispõe de textos no livro de Lucas (3:11, 3:13 e 3:14) que entre os sinóticos é o único com versão detalhada do batista referente aos “frutos dignos de uma mudança de mentalidade”, onde é visto com muito mais realismo. A multidão: ele sugere a divisão de túnicas e alimentos; Aos publicanos: não exigir mais do que a taxa marcada. A uns soldados: não praticar torturas nem chantagens, contentai com seu soldo. Apontando assim a situação grupal de cada um e a sua conversão central. Conclui-se que Jesus foi muito mais político do que escatológico e era essa a necessidade dos dois grupos de Jesus, a instalação do reino de Javé do que o juízo apocalíptico, embora nenhuma imagem da por afirmada a presença atual do reino em forma completa sobre a terra, principalmente se analisar o tempo do verbo das bem-aventuranças, com exceção da primeira, as outras usam o verbo no futuro, além da ausência do verbo “ser” dos originais aramaicos.

Os homens colaboram com essa vinda e isso é o menos que se pode dizer quanto à intervenção que se exige deles, pois suas necessidades são compreendias no quadro global, porém a pergunta que Juan Luis Segundo faz é: esperou Jesus a chegada, durante sua vida, do reino de Deus com poder? De acordo com Juan Luis, para os exegetas atuais a resposta é afirmativa. Então baseando-se em três elementos relaciona a seguir. O primeiro situado nos três sinóticos “Em verdades vos digo: alguns dos presentes não sofrerão a morte até que vejam chegar o reino de Deus” (Mc 9:1); O segundo constituído por um pequeno apocalipse, também dentro dos sinóticos, que aparece com uma pergunta desconcertada dos discípulos pelos sinais e a resposta é: “a vinda do Filho do homem sobre as nuvens com grande poder e majestade” (Mc 13:26), porém os evangelistas acrescentam um paradoxo enigmático que por um lado ninguém sabe, nem os anjos, nem o Filho do homem, mas somente o Pai, o dia e a hora. Por outro, o tempo está tão próximo que Jesus pode dizer que em verdade eu vos digo, não passará esta geração antes que tudo isso aconteça. O terceiro elemento aparece ainda que não seja comum aos três sinóticos (pelo fato de Lucas, no intuito de extinguir o que lhe pareça desrespeito, o exclui) como um grito de surpresa e desorientação com que Jesus morre na cruz: “meu Deu, meu Deus, porque me abandonastes?” (Mc 15:34 e Mat 27:46).

Então conclui Juan Luis que o reino não chegou “com poder” enquanto durava a geração que escutou Jesus profetizar, mas de acordo com Paulo na sua carta aos Romanos, Jesus foi “constituído Filho de Deus com poder, por sua ressurreição dentre os mortos” (Rm 1:4), sendo assim é transparente a admissão que jesus esperou em vão durante sua vida essa irrupção com poder do reino de Deus, mas comprova que sua comunidade foi compreendendo gradualmente que com sua ressurreição dentre os mortos ela se tinha realizado. Jesus teve um destino humano, concreto e histórico, trabalhou com mãos de homem na construção do reino que empregou para nos revelar o Pai através da iminência concreta trazendo a marca de uma história que não volta atrás.

(7) Anexos da primeira parte
1 - JESUS RESSUSCITADO

Ficando o tema mais concentrado no livro “Cristologia” o vol. II/II desta série, a ressurreição de Jesus constitui um fato verificável da história da Igreja nascente. Porém inserindo no contexto do Jesus histórico, toma-se como instrumento os próprios evangelistas, que partindo da idéia em confiar que os discípulos de Jesus são sinceros ao narrarem terem visto Jesus depois de sua morte. A questão histórica da aparição do Ressuscitado concentra-se de todo relato Paulino, além de João que se une aos sinóticos. Comprova-se que as parábolas atribuídas a Jesus parecem indicar mais um ensinamento e assim estabelecer um novo grau de compreensão alcançado pelos discípulos (Lc 24:45-46). Porém esses têm dificuldades em distinguir Jesus no ressuscitado, prova de que a nova forma material não permitiu econhece-lo.

De fato o gênero literário dos relatos evangélicos das aparições é muito implícito, mas confirmam a fé existente e ai passa de “crer” a “ver”, ou seja, essa fé diante do escândalo da cruz, Jesus aparece ressuscitado, mas somente para aqueles que creram antes da morte de Jesus. É como se ecoasse em novo plano a advertência de Jesus “...convertei-vos e crede na boa-notícia”, apesar de não haver uma só que seja testemunha imparcial. As narrações sobre as aparições de Jesus não são históricas, mas isso não quer dizer que não sejam verdadeiras. Sua verdade é mais que histórica e depende, por isso da fé, é uma verdade sobre a história, pertence ao plano escatológico no qual se julga e verifica o sentido da história vivida.

Por isso diz-se que a realidade escatológica toca no ponto da existência histórica dos discípulos, aos lhes proporcionar experiências do resultado de opiniões diferentes que significavam, contra a morte e o nada, os valores pregados e praticados por Jesus. Tangencialmente não estabelece referência alguma a uma diminuição de importância significativa, refere-se, isso sim, ao sutil e oculto de sua entrada histórica.



(8) Anexos da primeira parte
2 - ALGO MAIS SOBRE A CHAVE

Chega o momento, também lógico, em que a chave política parece esgotar-se e apelar a outro tipo de interpretação para dar conta dos fatos. De acordo com os evangelhos, o conflito provocado por Jesus chegou a um ponto em que as forças pareciam tão equilibradas que, tanto um grupo quanto o outro, se temiam ou se previam a vitória do rival, por este motivo, de acordo com a tradução de Lucas (Lc 24:18-21), os discípulos esperavam a liberdade de Israel, se referindo ao poder que Jesus revelava, e isso era demonstrado por Jesus, porém, em favor da compaixão que ele tinha pela multidão para alimentá-los e não para dar estrutura mais estável. Juan Luis diz que apesar das incontestáveis urgências que se encontra em Jesus, sua ação interpretada em chave política, aponta muito mais para uma eficácia a longo prazo.

Dentro das suposições, é possível que Jesus pensasse ter muito tempo para continuar com sua política conscientizadora à longo prazo em favor dos pobres e do reino; é possível que contasse com uma poderosa intervenção do próprio reino para assegurar esse prazo. É ainda mais provável que fosse surpreendido pelo momento crítico que levou a morte e pelo silêncio de Deus. Não se sabe, mas isso não invalida a chave global do seu ministério, nos obrigando a substituir por outra. O certo é que os numerosos conflitos que Lucas nos relata a propósito da Igreja primitiva não se parece em nada ao conflito gerado, segundo o mesmo Lucas, por Jesus de Nazaré.

Diz-se "ainda" porque esta chave política, de acordo com Juan Luis Segundo, foi a chave de Jesus para dar sentido à sua ação: o Mestre da Galiléia entendeu a si mesmo como portador de uma mensagem transformadora da realidade, uma mensagem, portanto, política (a "boa nova aos pobres"). Paulo, ao perceber que esta modificação profunda não se produzia, viu-se obrigado a explicitar o conteúdo de sua fé cristã em termos de uma chave antropológica. A mudança que ocorre a partir da ressurreição de Jesus na história afeta em primeiro lugar o ser humano. Esta chave antropológica, pós-pascal, perfila-se a partir da tomada de consciência da escatologia paulina, que torna possíveis e necessárias estas duas afirmações: “o mundo muda” radicalmente para o homem graças a Cristo e o mundo não tem mudado em nada com Cristo. “O Reino já chegou com poder e o Reino não chegará jamais com poder na história”.

O Novo Testamento, incluindo os três sinóticos, mostra que o sentido de Jesus vai em busca de expressões criativas para cada contexto. Seguir Jesus não é sacralizar a ideologia que ele usou e forçar as circunstâncias infinitamente variáveis ao escutar as mesmas palavras e presenciar idênticos acontecimentos. Trata-se de “criar” evangelhos para expressar a fé de Jesus com as ideologias que melhor possam veiculá-las aqui e agora. O NT é o melhor exemplo de uma coleção de “chaves” diferentes em torno de uma mesmo personagem histórica: Jesus de Nazaré. Todas elas são chaves humanas, porque Deus não tem outra linguagem para falar ao homem.